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Integração

Executivos brasileiros de seguros discutem, em Paris, regulação e transição climática

Comitiva participa de diversos eventos e reuniões no País com empresas e órgão regulador

Integrantes da comitiva de representantes das seguradoras em encontro na sede da Guy Carpenter, em Paris
Integrantes da comitiva de representantes das seguradoras em encontro na sede da Guy Carpenter, em Paris

Uma comitiva formada por executivos de seguradoras brasileiras e da CNseg, parlamentares e integrantes do governo brasileiro cumpriu hoje, 3 de junho, uma extensa agenda em Paris, com reuniões com empresas e o órgão regulador francês para troca de informações sobre o mercado de seguros e resseguros. Estiveram com as seguradoras AXA e a corretora internacional de resseguros Guy Carpenter e com a ACPR, Autoridade de Supervisão e Resolução Prudencial da França.

Com a ACPR, os debates abordaram o regime prudencial do setor na França, com ênfase nos três pilares da Solvência II: exigências quantitativas, governança e transparência. Também foram discutidas as novas regras em vigor no país este ano, que exigem estruturas robustas de gestão de riscos cibernéticos, realização de testes de estresse e obrigações de reporte. A comitiva brasileira também conheceu a Lei Europeia de Inteligência Artificial, aprovada em 2023, que regula o uso da tecnologia com foco em explicabilidade e equidade. Outro tema tratado foi o mercado francês de Seguro de Proteção de Crédito (CPI), destacando seu porte e estrutura regulatória.

AXA

Durante o encontro com a seguradora AXA, os executivos foram recebidos pela CEO brasileira Erika Medici. A reunião tratou das estratégias da empresa para adaptação às mudanças climáticas, baseadas em três eixos: mitigação, uso intensivo de análise de dados e definição de políticas públicas. Entre as principais iniciativas estão o fim da subscrição de riscos associados ao carvão até 2050, apoio a fontes renováveis de energia e incorporação de princípios da economia circular.

A AXA adota exclusões específicas para carvão, petróleo e gás, e desenvolve produtos voltados à transição energética. A companhia pretende apoiar 9.000 empresas até 2026 e está treinando 130 mil funcionários com apoio de inteligência artificial. Também vem investindo em plataformas digitais para gestão de riscos e divulga métricas como a exposição ao carvão. Na regulação de sinistros, tem adotado práticas sustentáveis, como o uso de peças recicladas e avaliações remotas.

Outro foco da conversa foram as iniciativas ambientais da seguradora, incluindo parcerias com empresas internacionais no combate à poluição por grânulos plásticos e ao desmatamento. A AXA informou ainda que está criando novos produtos ligados a projetos ambientais e deve anunciar uma nova iniciativa até novembro. A empresa também desenvolve uma plataforma para gerir grandes volumes de dados relacionados à sustentabilidade.

Guy Carpenter

Na reunião com a Guy Carpenter, o destaque foi o esquema Netcat do mercado francês, que cobre riscos catastróficos antes considerados inasseguráveis, como terremotos, inundações e perdas agrícolas. Trata-se de um modelo de parceria público-privada para fortalecer a resiliência diante das mudanças climáticas.

A CCR, resseguradora pública ligada ao Estado francês, desempenha papel central no sistema, criado em 1992 e sustentado pelos princípios de solidariedade e responsabilidade. O modelo impõe um adicional de 20% sobre os prêmios de seguros patrimoniais e 9% sobre o seguro de veículos. Em 2023, mais de 200 milhões de propriedades foram cobertas e mais de 3 milhões de sinistros indenizados. A estrutura também financia ações de prevenção, com uma taxa de 12% sobre os prêmios. Entre os desafios do modelo estão manter o equilíbrio financeiro, ampliar as ações preventivas e garantir a segurabilidade, segundo a Guy Carpenter.

Ainda segundo a companhia, o mercado de seguros agrícolas da França passou por uma reforma profunda em 2023, com o objetivo de ampliar a adesão ao seguro multirriscos climáticos (MPCI), frente ao aumento de eventos extremos e à redução do número de produtores — atualmente cerca de 400 mil, distribuídos em 27 milhões de hectares. A Gruphama, lidera o setor, segurando mais da metade das áreas cobertas por MPCI no país.

A reforma introduziu um modelo híbrido que combina seguro privado com subsídios estatais de 70% sobre o prêmio, desde que o produtor cubra entre 70% e 100% da mesma cultura e utilize dados históricos para definir a cobertura. Até 2021, menos de 35% das áreas de grãos e vinhedos estavam seguradas, enquanto frutas e pastagens tinham proteção mínima, por conta da concorrência com o Fundo Nacional de Calamidades, visto como uma solução gratuita pelos agricultores. A exclusão gradual de setores desse fundo e eventos severos, como a geada que atingiu 90% dos vinhedos em 2021, evidenciaram a fragilidade do sistema anterior e motivaram a reforma. O novo modelo busca alcançar 60% de cobertura em grãos e vinhedos e 30% em frutas e pastagens, aumentando a resiliência do setor.

Hoje, o seguro agrícola francês se baseia em modelo de cobertura por produtividade, com avaliação de perdas em campo e obrigatoriedade de incluir todos os riscos climáticos — como geada, seca, granizo e excesso de chuvas. Embora o subsídio de 70% cubra o seguro básico, opções como redução de franquia ou cobertura específica para granizo são comercializadas no mercado, mas sem subsídios. A estratégia combina incentivos regulatórios e financeiros para fortalecer o setor diante das mudanças climáticas.

Para Alexandre Leal, diretor técnico da CNseg e integrante da comitiva, os encontros mostraram que o arcabouço regulatório brasileiro está em linha com o europeu. “Os desafios são parecidos. É interessante observar que, em temas ligados à sustentabilidade, a Europa está mais avançada na análise e modelagem de dados, pelo menos no que chega às seguradoras. Uma aproximação maior com a academia poderia ajudar a reduzir esse gap de modelagem e informações”, afirmou o executivo.

Delegação brasileira de representantes do setor de seguros e convidados