Vivemos na era dos rastros digitais. Cada clique, cada transação, cada formulário preenchido gera uma nova linha em algum banco de dados. As seguradoras, assim como muitas outras empresas, passaram a acumular enormes volumes de informações sobre clientes, corretores, produtos, hábitos, desistências, conversões.
A promessa parecia clara: com mais dados, viria mais precisão, mais inteligência, mais competitividade. Mas será que essa equação tem se cumprido na prática?
Um número isolado pode ser apenas isso — um número. Informação, por outro lado, é o que nasce quando os dados são processados, contextualizados e ganham sentido. Suponha que uma seguradora observe que o índice de engajamento com suas campanhas comerciais varia bastante entre as regiões do país. O dado bruto poderia sugerir que há corretores menos interessados ou menos ativos. Mas será que é isso mesmo?
No Nordeste, é comum encontrarmos grandes corretoras com redes de prepostos ou produtores vinculados — profissionais que atuam na venda, mas que não têm, por exemplo, acesso direto aos sistemas da seguradora ou a treinamentos formais. Já no Sul e Sudeste, predominam pequenos corretores com registro na Susep próprio, mais independentes e diretamente conectados às ferramentas da companhia. Nesse contexto, será que faz sentido entregar a mesma campanha, no mesmo formato, com as mesmas expectativas de leitura e repasse? Ou será que precisamos adaptar a linguagem, os canais e até os modelos de incentivo para refletir as diferentes formas de atuação? É nessa hora que o dado começa a virar insight — e a comunicação, de fato, começa a fazer sentido.
Na prática, o que observo — como corretor e alguém que vive o dia a dia da operação — é que muitas vezes os dados até são gerados e analisados. Eles existem, aparecem em dashboards, relatórios, apresentações. O desafio é fazer com que se transformem em ações, em decisões alinhadas com a realidade da ponta. Talvez falte uma ponte mais eficiente entre quem analisa e quem executa. Talvez estejamos confiando demais que os números “falam por si” — mas será que falam mesmo?
Outro ponto que me intriga: quem é responsável por transformar esses dados em comunicação útil e engajadora? Muitas vezes, a tarefa recai sobre quem entende profundamente do mercado de seguros, mas que não tem formação em comunicação. Ou, ao contrário, sobre quem domina o discurso publicitário, mas não vive a realidade do corretor, do gerente comercial ou do segurado. Será que não estamos subestimando a complexidade de fazer essa tradução?
Em algumas empresas, vejo o esforço de marketing centralizado, campanhas amplas, peças bem elaboradas — mas que chegam aos corretores de forma padronizada, sem abertura para ajustes regionais, sem escuta ativa da ponta. E aí surge a dúvida: será que a campanha que funciona em São Paulo ressoa da mesma forma em Campina Grande ou em Manaus?
Muitos falam sobre “regionalizar a comunicação”, mas poucos conseguem de fato fazer isso. Talvez porque isso exija mais do que adaptar sotaques ou trocar imagens em peças. Regionalizar, nesse caso, é entender o comportamento local, a relação com o produto, a jornada do cliente. E quem melhor entende isso, muitas vezes, são os gerentes e corretores locais. Será que não faria sentido envolver essas pessoas na criação da mensagem? Não como “repassadores” da campanha, mas como coautores da comunicação?
Há quem diga que algumas empresas já começam a testar modelos mais compartilhados, com núcleos regionais de comunicação ou campanhas cocriadas entre marketing e operação. Os resultados ainda são tímidos, mas parece haver sinais de melhora em engajamento, compreensão e até performance comercial. Seria esse o caminho?
Esse desafio não está restrito ao relacionamento com o cliente. Dentro das próprias seguradoras, não são raras as situações em que um benefício relevante é pouco conhecido entre os colaboradores — simplesmente porque a comunicação interna não conseguiu dar o destaque e a clareza necessária. E se mesmo dentro da casa a mensagem não chega como deveria, o que dizer da complexidade de comunicar valor ao cliente final, passando por diversas camadas de interpretação?
Talvez estejamos investindo demais em tecnologia e de menos em pessoas. Ferramentas para analisar dados são importantes — mas será que não precisamos, com ainda mais urgência, de profissionais capazes de traduzir esses dados em histórias, argumentos, estratégias?
O que aconteceria se, em vez de entregar relatórios prontos, as áreas de inteligência se sentassem à mesa com os gerentes regionais para debater hipóteses juntos? Se o marketing conversasse diretamente com os corretores antes de criar campanhas? Será que não surgiriam soluções mais adaptadas, mais eficazes e até mais baratas?
O setor de seguros é competitivo e cheio de nuances. Todos querem fazer melhor uso dos dados — mas talvez estejamos pulando etapas fundamentais: ouvir, contextualizar, adaptar. E, principalmente, perguntar mais e afirmar menos.
Porque no fim das contas, não vence quem tem mais número no sistema, mas quem consegue transformar esses números em mensagens compreensíveis, relevantes e acionáveis — seja para o corretor, para o cliente ou para o próprio time.
Talvez o futuro da comunicação no setor de seguros esteja menos na próxima grande tecnologia e mais na simples (e complexa) arte de conversar melhor.