Como trabalhar com os órgãos de governança em sociedades de qualquer natureza
Por Isabel Vieira
Por muito tempo o termo “Governança Corporativa” foi usado apenas por sociedades anônimas de capital aberto, que operam na bolsa de valores e recebem investimentos externos. Atualmente, com o crescimento exponencial da tecnologia, com a chegada da transformação digital nas empresas, aumento de startup’s, dentre diversos outros fatores, esse tema assume relevância e entrou na pauta de deliberações de diretorias e administradores.
Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC): “Governança corporativa é o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas.”
Porém, ainda há resistência por parte de sociedades familiares, limitadas ou de pequeno e médio porte em relação à adoção das práticas de governança corporativa. Isso porque criou-se a ideia de que o custo é alto e tais ações são desnecessárias para manutenção do negócio. No entanto, com o aumento de pessoas empreendendo e o mercado cada vez mais competitivo, as empresas devem se preparar para sua preservação a longo prazo, através de medidas para otimização de valores (financeiro, intelectual, humano, reputacional, dentre outros), facilitação de acesso a recursos e melhoramento do sistema de gestão e tomada de decisões.
Para tanto, a governança se vale de agentes (acionistas, sócios, administradores, etc.) e de órgãos (conselho de administração, conselho consultivo e fiscal, auditoria interna, comitês de assessoramento, etc.).
No caso do Conselho de Administração, é um órgão colegiado responsável pelo processo decisório da sociedade, em relação ao direcionamento estratégico da organização. Para o IBGC, cabe ao Conselho de Administração: “identificar, discutir e garantir a disseminação dos valores e princípios da organização”. Deve definir estratégias e tomar decisões que protejam a organização, otimizem o retorno do investimento no longo prazo, e busquem o equilíbrio entre as expectativas das partes interessadas. Deve promover uma cultura organizacional centrada nos valores e princípios da organização (…)”.
É um órgão previsto na lei das sociedades por ações e não tem equivalente na estrutura legal das sociedades limitadas, ou seja, seria um órgão a ser instituído somente nas S.A.’s. Porém, nada impede que, nas sociedades limitadas, seja criado um órgão colegiado para deliberação sobre assuntos estratégicos. Isso pode ser feito através de um acordo de sócios ou até mesmo através de definições específicas de atuação de cada sócio administrador no próprio contrato social.
Já o Conselho Consultivo não toma decisões, tampouco tem poderes de administração do negócio. É, como o nome já diz, um órgão colegiado de aconselhamento, que propõe recomendações à administração da sociedade. Tais propostas têm caráter facultativo, ou seja, podem ou não ser levadas à prática pelos administradores. Em suma, tem como objetivo contribuir com a organização societária, auxiliando na melhoria gradativa e transparência da gestão societária, assim como o assessoramento na tomada de decisões.
Diferente do Conselho de Administração, o Conselho Consultivo não está previsto em lei e pode ser implantado em qualquer tipo de sociedade, de qualquer tamanho, bastando para tanto que seja instituído pelos administradores e cujas regras de funcionamento (composição, atuação, prazo de mandatos, periodicidade de reuniões, etc.) estejam previstas em Regimento Interno.
O Conselho Consultivo será composto por membros sem vínculo com a administração da sociedade, e aqui está o maior benefício para a sociedade, pois os conselheiros poderão trazer visões externas para o negócio, sem qualquer influência pessoal ou até mesmo os ‘vícios’ de comportamento e interpretação.
Trazer para a discussão estratégica pessoas com experiências, atuações, expertise e visões diferentes promove a sustentabilidade e perenidade do negócio, além de auxiliar no desenvolvimento pessoal e profissional, tanto dos próprios administradores/executivos, quanto dos colaboradores.
Ainda, em casos em que o empresário atua como individual, ou em sociedade limitada unipessoal, é comum sentir falta de uma segunda opinião ou dessa visão colegiada sobre determinado assunto, podendo inclusive, tomar decisões com base em suas convicções pessoais sem levar em consideração a organização como um todo.
Outro ponto importante a ser considerado é que, como os mandatos dos conselheiros, em regra, tem prazo de 2 a 3 anos, podem ser nomeados profissionais com expertise necessária para um momento ou demanda temporal da sociedade, sem necessidade de contratar colaboradores especializados (que geram vínculo empregatício), ou até mesmo custear a especialização dos administradores naquela área.
Por fim, a constituição de Conselho Consultivo gera valor para a organização como um todo, sendo apreciado pelos próprios colaboradores, consumidores, fornecedores e demais partes interessadas, além de gerar maior engajamento e comprometimento dos administradores com os resultados, metas e estratégias traçadas.
Isabel Vieira é Advogada Corporativa. Graduada em Direito, com pós-graduação em Gestão Tributária e em Direito Civil com ênfase em Direito Processual Civil. Possui ampla experiência nas áreas de Direito Empresarial, societário e contratual. Integrante do time jurídico e Governance Officer da Lojacorr S.A. Rede de Corretoras de Seguros.